Estava vendo este vídeo aqui e me deparei com um pastor falando sobre a Bíblia Católica (usando o deuterocânone) ser perigosa por possuir livros “apócrifos”, que são rejeitados pela maioria dos cristãos mundo afora. Mas será mesmo?
Isso nem sequer se enquadra como heresia, mas é interessante citar, e eu nem vou entrar no tópico do porquê o deuterocânone é ou não válido, só falar especificamente sobre o tópico dele ser ou não aceito pela maioria dos cristãos.
Comecemos definindo o que é um cristão, que é um seguidor do credo niceno (que condena o arianismo e outros movimentos não-tradicionais). Isso já corta da definição os judeus, os judeus messiânicos, os testemunhas de Jeová, os mórmons, os espíritas, os umbandistas e outros grupos heterodoxos que podem usar a Bíblia Sagrada ou parte dela. Após, consideraremos como deuterocânone todo o qualquer livro além dos 39 livros do Antigo Testamento aceitos pelos protestantes, incluindo as igrejas ortodoxas que aceitam livros que não tem nada a ver com os livros do deuterocânone que você já está acostumado. Por fim, consideraremos como “aceitar o deuterocânone” o uso parcial ou total do deuterocânone dentro de sua tradição.
No Brasil, simplesmente não tem discussão, os católicos superam 50% da população total do país, ou seja, 50% do país está em plena ou parcial comunhão com Roma, e aceita parcial ou totalmente o deuterocânone como o conhecemos ou outro cânone conhecido. Agora vamos para as estatísticas mundiais.
Segundo o Observatório Romano, o número oficial de católicos é de 1 bilhão e 345 milhões de católicos, sendo cerca de 400 mil o número só de sacerdotes ordenados. Se unirmos isso ao número de orientais (cerca de 18 milhões), à quantidade total de grupos católicos independentes ou irregulares (19 milhões ao todo, segundo a Wikipedia) e aos ortodoxos bizantinos (220 milhões) e ortodoxos orientais (62 milhões), chegaremos ao impressionante número de 1 bilhão e 644 milhões de indivíduos pertencentes a denominações cristãs que utilizam o deuterocânone.
Agora, vamos unir os anglicanos (90 milhões), luteranos (77 milhões), batistas (100 milhões, mas normalmente só contam 65 milhões, porque não consideram crianças como membros), calvinistas e reformados (80 milhões), metodistas (60 milhões + 20 milhões que ocasionalmente congregam juntos), adventistas (22 milhões), pentecostais (280 milhões, e, como os números a seguir são muito esparsos, estou usando os números da Wikipedia mesmo, e eles são bem mais otimistas que os das próprias igrejas), seguidores de igrejas africanas (60 milhões), seguidores de igrejas patrióticas chinesas (braço religioso do PCC, com 25 milhões), protestantes orientais (22 milhões), seguidores da Igreja Nova Apostólica (10 milhões), restauracionistas (7 milhões), anabatistas (4 milhões), assembleianos de irmãos (1 milhão), quakers (0.4 milhão), hussitas (1 milhão) e não-denominacionais (100 milhões), dá a soma total de 956.4 milhões de protestantes seguidores de movimentos que estão de acordo com o credo niceno (note que não adicionei judeus messiânicos e igrejas locais ao cálculo pois não tem como garantir que sejam seguidores do credo niceno, na verdade, deveria até retirar os não-denominacionais, mas hoje estou bonzinho).
Ou seja, em números absolutos, temos mais de 1 bilhão e meio de cristãos que aceitam alguma forma de deuterocânone contra menos de 1 bilhão que não aceitam. Isso significa que cerca de 63% dos cristãos aceitam o deuterocânone, e, em números absolutos, temos 1.7 cristãos seguidores de algum deuterocânone para cada não-seguidor.
Na verdade, mesmo que a gente una as igrejas locais, os mórmons, os testemunhas, os pentecostais de unidade e outros grupos menores, o número total de “seguidores de Cristo” (num sentido genérico, que inclui os não-trinitários e os não-seguidores do credo niceno), ainda teremos quase 1 pessoa e meia que aceita algum deuterocânone para cada um que rejeita os deuterocanônicos.
Em suma, não fique acreditando no que o primeiro pastor de YouTube te disser. Claro que existem protestantes sérios, mas esse tipo de teoria, de que católicos são algum tipo de minoria, não faz sentido nenhum. Não digo que não há bons argumentos para crer no cânone judaico (sem o deuterocânone), porém esse tipo de afirmação que nega estatística é, no mínimo, controversa (para não dizer desonesta).
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