Então Jesus morreu num poste?

Cristo crucificado em uma crux simplex

De todas as heresias da Torre de Vigia, a que mais me surpreende é essa, que nem sequer faz sentido: a de que Jesus não morreu numa cruz como estamos acostumados, e sim num poste. E realmente não faz sentido nenhum pregar essa bobagem, porque não tem nem sequer alguma motivação além de dizer que o resto do mundo tá errado enquanto a Torre de Vigia está certa.

Há quatro modelos de cruz usualmente usados pelos romanos:

  • Crux Simplex: em forma de poste, a crux simplex era a mais simples de se executar uma pessoa, era só pendurar ou pregar ela em um poste qualquer, ou, na ausência dele, até em uma árvore aleatória. Essa é a cruz sugerida pelos Testemunhas de Jeová;
  • Crux Commissa: os romanos também usavam uma cruz conectada, ou Tau (porque parece a letra grega Tau), que, ao contrário do que estamos acostumados, seria em formato de T, com os braços pregados nas laterais e os pés no cerne;
  • Crux Imissa: essa é a cruz tradicional, com uma ponta se estendendo acima da travessa horizontal, ou patíbulo;
  • Crux Decussata: cruz em forma de X, formada por duas pranchas de madeira posicionadas e presas juntas em forma de X, com a vítima pregada com os braços e pernas estendidas nessa posição.

Ok, mas então qual delas é a cruz correta? Vejamos alguns fatos bíblicos.

Segundo João 19:17-18, Jesus carregou sua cruz. Isso, automaticamente, já descarta a crux simplex, pelo simples motivo de que a mesma tinha como objetivo principal não ser movida. Além disso, em João 20:25 (mesmo na Tradução do Novo mundo) é dito sobre os pregos (no plural), enquanto a crux simplex prevê um único prego ou cravo para ambas as mãos. Os Testemunhas de Jeová ainda justificam, dizendo que staurós tinha o significado de estaca, e tinha mesmo, porém seis séculos antes de Cristo, antes da cruz ser considerada um instrumento de suplício. No período citado, também não havia uma palavra própria em grego para “cruz”, então foi usado staurós, ou stavrós (e é assim até os dias de hoje, inclusive, tanto que a palavra atual para estaca é paloúki) como uma simplificação de sentido, e não como uma tradução literal (algo que a Bíblia faz muito).

Ok, então a cruz em Tau? Também não, a cruz de Cristo tinha uma placa acima de sua cabeça escrito “Iēsus Nazarēnus, Rēx Iūdaeōrum” (cf. Mt 27:37, Lc 23:38, Jo 19:19), e não tem nada acima da cabeça de um crucificado em um Tau, logo, também não podia ser essa cruz. Com braços estendidos, a cruz deveria ter, então, no mínimo quatro extremidades, o que nos leva a próxima cruz da lista.

Para a cruz em forma de X, observe a imagem abaixo:

Santo André crucificado

Ok, agora, por favor, me explique onde poderia ser colocada a placa para estar imediatamente acima da cabeça de Cristo. Não dá, né? Pois é.

Além disso, ao contrário do que afirmam os Testemunhas de Jeová, existem evidências históricas de que a cruz imissa era usada mesmo na época dos apóstolos, muito antes de Constantino, por vários grupos. Se quiser, tem algumas aqui para você conferir. Além disso, Paulo esteve em Pozzuoli antes da erupção do Vesúvio, e uma casa do período aparenta ter sido usada como igreja doméstica:

Igreja em Pompeia

Como pode ver, um sítio arqueológico intocado por quase dois mil anos tinha a cruz como principal referência a Cristo. Curioso, não? Parece que, no final das contas, os Testemunhas de Jeová se embasaram (de novo) em informação inexistente.

São Pedro crucificado

Fora isso que Simão Pedro foi crucificado de cabeça para baixo porque não se considerou digno de morrer como seu mestre. Este morreu com os braços esticados (cf. João 21:18-19) e de cabeça para baixo, o que está amplamente documentado na patrística.

Cristo crucificado

A conclusão é óbvia: não existe nada que aponte de forma conclusiva para um “poste”, e sim para uma cruz.

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